Quando um projeto de pesquisa extrapola o caráter científico
Ricardo Aurino de Pinho, PhD - Coordenador do Lafibe e pesquisador responsável do Projeto
A pesquisa científica é uma dimensão acadêmica da Educação Superior, que somada (e interligada) ao ensino e a extensão, se constitui como um dos principais alicerces de uma instituição universitária. Neste sentido, os projetos que desenvolvemos no Laboratório de Fisiologia e Bioquímica do Exercício – Lafibe/PPGCS/Unesc tem buscado, além da excelência científica na proposição e execução dos projetos bem como na veiculação dos resultados obtidos, extrapolar os muros da ciência e promover a extensibilidade de suas ações. Com isso, os projetos tendem não só a contribuir com avanço científico, mas, também, com a melhora da qualidade de vida daqueles que atuam como sujeitos de investigação na pesquisa. Talvez essa prática, adotada por todos, pudesse fortalecer o papel da ciência na sociedade.
Por 11 anos estamos estudando, em modelos experimentais (animais de laboratório), os efeitos do exercício físico na prevenção, progressão e tratamento da Doença de Parkinson. A DP é uma doença neurodegenerativa que promove distúrbios clínicos como tremor, rigidez, bradicinesia e instabilidade postural o que leva a morbidade e consequente mortalidade. Fizemos várias descobertas que estão publicadas em diversos periódicos internacionais como Neuroscience, Oxidative Medicine and Cellular Longevity, Brain Research Bolletin entre outros. Essa história começou com o ingresso do mestrando Aderbal Aguiar da Silva (hoje professor da UFSC) no Programa de Pós-graduação em Ciências da Saúde da Unesc, sob minha orientação. O referido mestrando me sugeriu investigarmos o papel do exercício sobre a DP, logo em seguida uma de minhas alunas de Iniciação científica, Talita Tuon (hoje professora na Unesc) deu continuidade e conclui seu mestrado e doutorado abordando o tema em questão. Os resultados obtidos nesses estudos e outros do laboratório nos permitiram promover uma translação daquilo que encontramos nos modelos experimentais e aplicar em pacientes portadores da doença. Foi assim que demos início em 2016 sob a coordenação da mestranda Hérica S. Fernandes a um projeto que se constituiu como uma das principais atividades científicas e agora de extensão do Lafibe. Pacientes diagnosticados com a DP foram recrutados para participar de um programa regular de exercícios físicos com as abordagens adotadas nos modelos experimentais e diferentes daquilo que até então tem sido proposto. Os resultados clínicos e os resultados bioquímicos e moleculares parcialmente obtidos foram surpreendentes, o que nos remete a propor uma mudança nos protocolos de intervenção sobre esses pacientes.
Cabe ressaltar que os resultados obtidos são de extrema relevância e irá contribuir para o avanço da ciência nesse campo de conhecimento, no entanto, esses resultados não são mais importantes do que a melhora na qualidade de vida dos pacientes participantes. Pacientes que se isolavam do convívio social, que possuíam elevada dificuldade de locomoção, que estavam à margem dos afazeres de rotina, que mal se comunicavam, que apresentavam acelerada progressão clínica da DP e outras doenças associadas tiveram evoluções surpreendentes em apenas dois meses de atividades terapêuticas. Nem sempre é possível atingir êxito num projeto com humanos similar ao que conseguimos em modelos experimentais e é por isso que daremos continuidade ao projeto, agora sem a motivação científica como objetivo primário, mas a motivação passa pelos avanços obtidos por esses pacientes que poderão usufruir desse padrão terapêutico e atingir um patamar no controle e no tratamento da doença que possa lhes conferir uma melhora na qualidade de vida futura.
Agradeço a mestranda e fisioterapeuta Hérica Salvaro Fernandes que liderou a execução do projeto, a professora Talita Tuoun que nos auxiliou na elaboração da proposta, aos alunos voluntários do curso de fisioterapia da Unesc (Miguel, Kalita, Karine, Jhenifer) e em especial aos pacientes portadores da DP que se disponibilizaram como sujeitos de investigação e acreditaram em nosso trabalho.
06 de fevereiro de 2017 às 14:30
Leitura, literatura e comprometimento
Richarles Souza de Carvalho - rsc@unesc.net -
Docente e coordenador do curso de Letras da Unesc -
Penso ser um bom momento para refletirmos sobre leitura. No mês de abril, reúnem-se, coincidentemente, algumas datas que falam sobre livros, logo sobre leitura. Vamos a elas.
No dia 2 de abril foi comemorado o ‘Dia Internacional do Livro Infantil’. A razão da escolha dessa data deve-se ao nascimento do escritor dinamarquês Hans Christian Andersen, autor de ‘O Patinho Feio’, ‘A Pequena Sereia’, ‘O Soldadinho de Chumbo’ mais de uma centena de contos. Existe um prêmio internacional – medalha Hans Christian Andersen – para autores de obras infanto-juvenis, oferecido pela International Board on Books for Young People. Alguns escritores brasileiros já receberam essa premiação.
O dia 18 foi reservado para o Dia Nacional do Livro Infantil. Nasceu nesse dia um dos maiores escritores brasileiros: José Bento Monteiro Lobato. Atribui-se a Monteiro Lobato a criação de uma verdadeira literatura infantil brasileira. O Sítio do Pica-Pau Amarelo é o suprassumo de sua obra.
O Dia Mundial do Livro – 23 de Abril – é mais uma data que quero lembrar. Nesse dia morreram o espanhol Miguel de Cervantes (de ‘Dom Quixote de la Mancha’) e o inglês William Shakespeare (‘Hamlet’, ‘Romeu e Julieta’). Curioso o fato de ter sido em um 23 de abril do mesmo ano (1616). A título de informação, o Dia Nacional do Livro é em 29 de outubro.
Todas essas datas, reunidas em um só mês, podem servir como pano de fundo para uma reflexão sobre a realidade de leitura no Brasil, a leitura literária e do consumo de livros.
Uma série de frases sobre a importância da leitura são ouvidas por todos cotidianamente: “Quem lê mais escreve melhor”, “Devemos ler mais para sermos melhores cidadãos”, “A educação (logo leitura) pode transformar um povo”, “A leitura é importante para o desenvolvimento” (cultural, psicológico, neurológico, e por que não econômico).
Tais afirmações são tão corriqueiras e de fácil aceitação que poderiam ser classificadas como clichês. A expressão clichê tem certa carga pejorativa e gostaria de fato de apelar para esse sentido em minha argumentação, pois, apesar de concordar com a maioria das afirmações (algumas em parte, outras, no todo) o fato de que a minoria das pessoas coloca em exercício tais afirmações, as coloca no patamar de clichês.
Explico: as pessoas falam que ler é importante, que se deve ler mais, contudo, na prática, os mesmos sujeitos que assim afirmam, pouco ou nada leem.
Alguns estudiosos advogam que nunca se leu tanto na história da humanidade. Com o advento da internet, é quase óbvio afirmar que todos temos acesso a uma infinidade de textos, de naturezas diversas. Os mesmos estudiosos afirmam que nunca se leu tão pouco. Isso mesmo, um paradoxo se instala. Por que nunca se leu tão pouco? Por que determinados tipos de leitura (para alguns de melhor qualidade) estão sendo cada vez menos praticadas. Entre elas, a leitura literária.
A leitura de literatura (e não entrarei aqui na eterna celeuma de “o que é literatura”) se apresenta como uma forma privilegiada de leitura, aquela que primordialmente trabalhará com subjetividade e imaginação, aquela que pode ser atemporal, pois dialoga com distintos leitores em diferentes épocas. Afirmo isso com certa tranquilidade, como professor e leitor de literatura, mesmo com o risco de também cair em um clichê. Argumenta em favor desse tipo de leitura, a explicação histórica das datas comemoradas em abril, apresentadas acima. Por exemplo, comemora-se o dia mundial do livro com alusão a escritores literários, logo a relação é com livros literários. Mas não existem somente livros de literatura.
Um cenário animador tem se apresentado nos últimos anos, com programas governamentais e privados de distribuição de livros, com ONGs relacionadas ao tema, com as feiras de livros, etc. Todavia, fica a cargo de cada um – o coletivo se constitui a partir do individual – a tomada de decisão para fazer com que os clichês mencionados anteriormente não sejam somente frases de impacto, mas de alguma forma contribuam para o enriquecimento cultural de cada um, para sermos melhores seres humanos. A leitura pode ajudar nessa tarefa. A leitura literária principalmente.
Abril está chegando ao fim, com várias datas que nos lembram da importância de ler. Mas não chega ao fim a necessidade de lermos cada vez mais e melhor. Qual nosso nível de comprometimento com a leitura? Você, qual livro está lendo agora?
Reconhecimento nacional da pesquisa desenvolvida na Unesc
Gildo Volpato (Reitor da Unesc)
A pesquisa na Unesc é uma dimensão acadêmica que tem recebido destaque e reconhecimento nacional e internacional através dos diversos prêmios conquistados. Essas conquistas decorrem do forte investimento que a instituição tem feito visando ao fortalecimento e ao desenvolvimento da pesquisa científica nos vários níveis de sua atuação como uma forma estratégica de garantir a sua consolidação enquanto Universidade.
Além de iniciativas como os programas de iniciação científica e o programa de grupos de pesquisa, a pós-graduação tem dado uma contribuição importante para a consolidação desta dimensão. Exemplo disso é o Prêmio ABC/Loreal/Unesco, que contemplou nas últimas edições três pesquisadoras da instituição, vinculadas ao PPGCS (Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde). A honraria é uma forma da Academia Brasileira de Ciências, da L’Oreal e da Unesco reconhecerem e estimularem a continuidade das brilhantes carreiras científicas. Ela é voltada à valorização das mulheres inseridas no universo da ciência e ao desenvolvimento científico.
Em 2009 a professora doutora Alexandra Ioppi Zugno recebeu o prêmio pelo trabalho “Avaliação da atividade da acetilcolinesterase e alterações comportamentais induzidas por ketamina em um modelo animal de esquizofrenia em ratos”. O estudo tem como objetivo conhecer os mecanismos de funcionamento da esquizofrenia e procurar novos tratamentos para a doença.
Em 2010 a professora doutora Patrícia Fernanda Schuck foi contemplada em decorrência do estudo intitulado “Mecanismos fisiopatológicos da fenilcetonúria: estudo dos efeitos in vivo da fenilalanina". Seu objetivo é buscar novas estratégias terapêuticas para a fenilcetonúria, doença genética que provoca grave retardo mental em crianças.
Já na última edição, em 2011, entre as pesquisadoras contempladas está a professora doutora Tatiana Barichello, que inscreveu a pesquisa intitulada “Avaliação comportamental, neuroquímica e a integridade da barreira hematoencefálica em cérebro de ratos jovens induzidos a meningite pneumocócica”. O trabalho de Tatiana tem como objetivo pesquisar o funcionamento do organismo durante as doenças infecciosas que acometem o sistema nervoso central. O seu intuito é compreender melhor os mecanismos de patogenicidade (capacidade do micro-organismo invasor em causar doença) e a resposta imune do hospedeiro.
A partir dessas conquistas e outras, como a primeira instituição não pública no Ranking Ibero-Americano 2010, a afiliação de pesquisadores na Academia Brasileira de Ciências, o aumento no número de bolsistas produtividade do CNPq, não restam dúvidas de que a Unesc é uma instituição de referência acadêmica em nível superior e indispensável para o desenvolvimento social e científico da região sul catarinense, do Estado e do Brasil.
Dia Mundial sem Tabaco: a contribuição do exercício na prevenção, controle e tratamento das doenças relacionadas ao Cigarro
Prof. Dr. Ricardo Pinho -
Coordenador do Laboratório de Fisiologia e Bioquímica do Exercício -
Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde/UNASAU/UNESC -
Dia 31 de maio é o Dia Mundial sem Tabaco. Criado em 1987 pela OMS (Organização Mundial da Saúde) e propagada pelas comunidades científicas internacionais, centros de controle, de prevenção e de tratamento alertam para as doenças e mortes evitáveis relacionadas ao tabagismo. De acordo com a OMS, fumar é considerado o fator de risco mais importante para o desenvolvimento de aproximadamente 50 doenças, incluindo o câncer, doenças cardiovasculares e enfisema pulmonar e as mortes atribuídas ao consumo de tabaco são estimadas em 6 milhões/ano em todo o mundo, mas podem chegar a 8 milhões/ano até 2030. Entre as diferentes formas de tabaco os cigarros industrializados são considerados a forma mais prevalente usada socialmente em áreas urbanas e o cigarro de palha é a segunda forma mais preferida por fumantes brasileiros, de acordo com o Instituto Nacional do Câncer.
Dado a essa preocupação, o Lafibe (Laboratório de Fisiologia e Bioquímica do Exercício da Unesc) vem ao longo dos últimos anos estudando formas que contribuem para amenizar os efeitos nocivos do fumo sobre a saúde. Um dos estudos publicado na Pulmonary Pharmacology and Therapheutics (2009) mostrou que a prática regular de exercícios melhora as mudanças histopatológicas e reduz a produção de radicais livres nos pulmões de animais cronicamente expostos à fumaça do cigarro. Neste mesmo sentido, nosso grupo também demostrou que o exercício físico praticado regularmente após a lesão induzida pelo cigarro ter se manisfestado (Neurochemical Research, 2011) ou antes da manisfestação (The International Journal of Chronic Obstructive Pulmonary Disease, 2015) inibe o surgimento de alterações mitocondriais no cérebro e histopatológicas no pulmão, respectivamente. Além dos efeitos nocivos provocados pelo cigarro industrializado, o cigarro de palha, embora seja uma forma popular de consumo, os seus efeitos nocivos na saúde humana permanecem desconhecidos. Em recente trabalho (em fase de publicação na Toxicology and Applied Pharmacology) nossos resultados sugerem que os cigarros de palha são tão prejudiciais quanto os cigarros industrializados, uma vez que os metais tóxicos e compostos orgânicos libertados no fumo durante a combustão são amplamente absorvidos no sistema respiratório, causando danos histopatológicos a vários tecidos. Nós também observamos que os diferentes tipos de cigarro promovem danos estruturais e elevados níveis de estresse oxidativo no músculo esquelético e no cardíaco, mas que estes danos são modulados pelo exercício físico. Além disso, temos demostrado que o consumo de antioxidantes, como os compostos fenólicos encontrados na erva-mate promovem proteção contra os efeitos nocivos do cigarro em diversos tecidos.
Por fim, acredita-se que além de adotar medidas comportamentais que evitem a exposição ou o consumo de cigarro, independente do tipo do cigarro, adotar práticas alimentares e comportamentais saudáveis podem ajudar a prevenir e/ou amenizar os efeitos deletérios que a fumaça de cigarro provoca no organismo. Frente a esse trabalho de investigação que o Lafibe vem desenvolvendo ao longo desses anos, algumas parcerias internas e externas têm se constituído a fim de somar forças para que, além de entender os mecanismos envolvidos na fisiopatologia das doenças relacionados ao cigarro, possamos propor programas de prevenção e formas terapêuticas que amenizem os agravos à saúde gerados pelo tabagismo. Neste sentido, cabe ressaltar a inclusão de pesquisadores do Lafibe junto ao INCA no projeto recém-aprovado pelo Ministério de Ciência e Tecnologia intitulado Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia para o controle do Câncer.
Escolhas de um pesquisador! Na visão de um professor/orientador/pesquisador
Prof. Dr. Ricardo Pinho -
Laboratório de Fisiologia e Bioquímica do Exercício -
Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde/UNASAU/UNESC -
Ser um pesquisador não é uma tarefa fácil como alguns ou muitos imaginam. É preciso muito mais do que vontade, é preciso fazer escolhas certas em momentos certos. Já formei (ou ajudei a formar) muitos jovens e, provavelmente, muitos ainda virão. Por isso resolvi escrever sobre as escolhas que fizemos e para onde elas podem nos levar. Tenho observado da necessidade de refletir um pouco sobre as escolhas que fizemos, particularmente na vida acadêmico-científica. Obviamente, muitas dessas escolhas são circunstâncias da própria rotina, outras são conveniências do momento, mas outras devem ser pensadas e repensadas antes que assumam responsabilidades e compromissos para não elevar o risco de um possível fracasso. O fracasso ou o sucesso não são diretamente frutos das escolhas que fizemos, mas do empenho e dedicação que aplicamos sobre cada uma delas.
Fiz muitas escolhas em minha vida e, na grande maioria, acertei. Isso não quer dizer que não errei em algumas delas ou escolhi equivocadamente. Entretanto, considero que as escolhas feitas me trouxeram bons frutos, mas esses frutos foram colhidos a partir da responsabilidade e do compromisso que tive em cada uma de minhas escolhas, tanto no campo pessoal quanto profissional. Fazer escolhas não é algo fácil, mas ao escolher é preciso tocar a diante ou então deixá-la de lado, o que também é uma nova escolha.
O sucesso nas escolhas que fizemos decorre de muita persistência, de muito suor, de muito trabalho e também de muita renuncia. Ser um pesquisador e cientista é isso, uma vida constante de escolhas e renúncias. Trabalhar nas férias, domingos e feriados, faz parte desse contexto. Renunciar encontros, festas, sol, mar e cerveja (de vez em quando, por que ninguém é de ferro) também. O que não pode é dar desculpas de que algo não foi feito por falta de tempo, problemas pessoais ou outros compromissos alheios às escolhas principais. Isso não cabe quando a escolha feita foi seguir ou ter uma vida de pesquisador ou cientista, ao contrário, o fracasso seria ou será mais pronunciado do que o sucesso.
Estamos continuamente a fazer escolhas e a cada escolha feita um fruto será colhido, ou seja, somos e seremos frutos das escolhas que fizemos. Portanto, àqueles que escolherem essa vida “maluca” da ciência, que assumam diuturnamente o compromisso que assumiram perante si e aos seus orientadores e exerçam suas atividades com responsabilidade para que os frutos a serem colhidos não caiam precocemente ou se tornem um sinônimo de fracasso, mas ao contrário, alimentem o sucesso que sempre é esperado quando fizemos as nossas escolhas.
Por: Davi Carrer 16 de novembro de 2015 às 16:22